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Guilherme Veroneze e Thiago Manzoni

Reflexões sobre as 6 lições de Mises: O investimento Externo (lição 5)

Muito se fala sobre as condições materiais de vida distintas em países pelo mundo, condições que são, por vezes, diametralmente diferentes e chamam a atenção. Muito se atribui, como causa para a disparidade de renda, a fatores pessoais ou culturais de certos povos (ética do trabalho ou engenhosidade pura e simples) o que pode ser altamente enganoso. Grande parte dessa diferença reside na disponibilidade de capital (humano, financeiro, tecnológico) nas nações mais desenvolvidas. O montante de capital investido per capita, por trabalhador ou cidadão, é substancialmente maior nas nações mais avançadas do que naquelas em desenvolvimento.


A realidade é que, pelas leis do mercado, um empresário não pode pagar a um trabalhador mais do que ele agrega no processo produtivo. Se pagar a mais do que aquilo que ele de fato contribui na geração de valor, sofrerá prejuízos e irá à falência. E, no tocante ao processo produtivo, ao dispor de instrumentos de maior qualidade e eficiência, um trabalhador poderá realizar a mesma tarefa em menor tempo e com menor índice de defeitos. O problema crucial dessa questão é dispor de meios - capital financeiro e capital humano capacitado – para promover essa melhoria dos processos que permitem destravar valor e alcançar o fator que está verdadeiramente por trás dos ganhos de renda: o aumento da produtividade.



As nações mais desenvolvidas tiveram, ao longo do tempo, uma postura de maior poupança e investimento frente às demais nações menos desenvolvidas. Consequentemente, conseguiram acumular capital para investir e modernizar seus parques industriais e infraestrutura, o que permitiu essa melhoria de produtividade que gera maior renda per capita. Contudo, a maior mobilidade de capitais, bem como um arcabouço mais liberal e com segurança jurídica, permitiu a vários países que não eram desenvolvidos até então acelerar esse processo de melhoria de produtividade nos séculos XIX e XX. Permitiu que as nações mais prósperas pudessem investir comercialmente nesses países menos desenvolvidos e, assim, com esse contato econômico, pudessem introduzir tecnologias que até então eram inacessíveis a esses países e que, se fossem buscadas apenas internamente, pelo próprio país sem investimento externo, talvez fossem alcançadas em tempo demasiadamente longo, retardando ainda mais o seu desenvolvimento econômico.


É preciso entender a dimensão concreta que esse investimento externo gerou. Desde investimento em infraestrutura como ferrovias, portos, minas, sistema elétrico, até a atuação de multinacionais fabris e de serviços, tal investimento permitiu que os países que o receberam também colhessem frutos dessa empreitada, seja por meio de melhores produtos e serviços disponíveis ao seu público consumidor, seja por meio de sua mão-de-obra sendo capacitada e tendo aprimoramento técnico custeado por essas empresas estrangeiras, dinamizando o próprio nível do capital humano local, além de tudo isso também mobilizar a economia e aumentar o nível de emprego. Muito preconceito nacionalista e infundado, de cunho emocional, existe em relação ao investimento externo, contudo ele foi o maior acontecimento econômico histórico dos séculos XIX e XX, segundo Mises.



Muito se defende a ideia do protecionismo como forma de política desenvolvimentista, de modo que a indústria local possa florescer sem ser aniquilada pela concorrência externa predatória. Contudo, o que se ignora nessa raciocínio é que para implantar uma fábrica ou modernizar alguma já existente precisa-se de capital, não de tarifas anti-importação. Tais tarifas, assim como controles de câmbio, são meios que na prática funcionam como barreiras para a própria aquisição de capital externo que pode permitir a dinamização dos parques fabris, bem como podem criar uma condição de tamanho conforto e proteção no mercado local cativo, para os empresários nacionais deitados em berço esplêndido, que causará estagnação e desestímulo à concorrência e à inovação. A única maneira de se dinamizar uma economia é com acesso a capital, e quando o capital interno é escasso, é bem-vindo o capital externo e os incentivos à competição via abertura externa.


Outra ideia equivocada que se tem é a de que o sindicalismo é o meio para alcançar a melhoria de vida dos trabalhadores de forma duradoura, sustentável, estável por lei ou contrato. Contudo, basta observar que os confortos de que os trabalhadores norte-americanos usufruem, são conquistados não por meio de ativismo sindical, mas sim por meio da livre iniciativa e dos ganhos de produtividade que uma economia liberal é capaz de proporcionar, ensejando, portanto, uma renda per capita mais elevada. O Brasil, para fazermos uma reflexão, é pródigo em direitos trabalhistas e em números de sindicatos. Aqui há mais de 16 mil sindicatos, enquanto nos EUA há menos de 200. Logo, se a existência de um sindicalismo forte e pujante fosse a causa da melhoria da renda, deveríamos observar níveis salariais mais altos no Brasil, o que sabidamente não ocorre.


Igualmente ineficazes são os decretos governamentais que estabelecem pisos salariais como uma forma mágica de supostamente melhorar a renda do trabalhador. Ora, pisos salariais só produzem poucos e já sabidos resultados econômicos deletérios. Ou desempregam (podendo também gerar inflação) ou são inúteis. Salário é um preço, o preço da mão-de-obra e, tal qual nas políticas de controles de preços já conhecidas, a definição arbitrária de um preço não produz efeitos positivos. A título de exemplo, imaginemos que em uma indústria de fabricação de móveis o salário de mercado, que equilibra trabalhadores ofertantes e empregadores demandantes, é de R$ 2.000. O governo, ao estipular um valor mínimo superior a esse, irá intervir na atividade produtiva e forçará o empresário a reduzir sua força de trabalho, porque este não consegue arcar com um custo maior, resultando então em desemprego, bem como incentivará o empresário a tentar automatizar parte de seu processo, tornando esse desemprego então gerado ainda mais duradouro no tempo. Por outro lado, se o piso for estabelecido no valor de mercado (R$ 2.000) ou abaixo será uma política inútil, que não melhora a vida de nenhum trabalhador, o que, de certo modo, já se sabe: é sempre o aumento da produtividade, via boa gestão e acesso a capital, que permite ganhos reais de salários, não a mera assinatura de decretos governamentais arbitrando salários-mínimos. Se o governo aumenta em demasia o piso salarial, o resultado certo é sempre o mesmo: desemprego. Ainda é necessário ressaltar que parte dessa política de pisos salariais pode gerar outro mal já falado: inflação, pois o empresário poderá tentar repassar seu súbito e arbitrário aumento de custos para o resto da sociedade.



Mises, ao discutir o investimento externo, trata de uma questão que é parte da solução para diminuir as disparidades econômicas no mundo, que é a mobilidade de capitais. Empresários buscam investir em países em que, além de alguma segurança jurídica, haja mão-de-obra abundante e competitiva em custos. Contudo, com o tempo, com a adoção dessas tecnologias e a dinamização da economia onde se investiu, os salários nesse país em desenvolvimento tendem a aumentar também, vide o ocorrido nas últimas décadas na China e Índia, onde centenas de milhões saíram da linha da pobreza em virtude de maior abertura comercial e investimento oriundo de capitais externos.



Por fim, ainda que muitos queiram colocar vantagens colonialistas a potências europeias, como fonte de acumulação de capital que possibilitou avançarem e se desenvolverem às custas de outras nações, o fato é que países pequenos e sem muitos recursos naturais ou sem tradição fortemente colonialista, como Suíça, Irlanda, Luxemburgo, Singapura, Islândia, Dinamarca, Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Hong Kong e Taiwan, dentre outros, conseguiram, mediante políticas liberais, avançar economicamente e se desenvolverem. Desse modo, percebe-se que não somente um estereótipo comumente lançado sob nações desenvolvidas, de que só conseguiram e desenvolver às custas de outros países, é uma falácia, bem como se pode perceber que as relações entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, mediante investimento externo, é essencial para que esses possam obter capital e melhoria de tecnologia para traçarem o caminho para o seu próprio desenvolvimento. A economia é um organismo vivo onde indivíduos, empresas e nações interagem e, como todo organismo, a capacidade de aprender nessas interações é crucial para o aprimoramento e desenvolvimento. Ao criarmos condições para receber investimento externo - segurança jurídica, melhor infraestrutura, menores restrições aduaneiras e tributárias - estaremos nos expondo ao processo de desenvolvimento, aumentando decisivamente a nossa probabilidade de alcançar mais prosperidade, mais renda e qualidade de vida para nossos concidadãos. Xenofobia empresarial é que constitui o caminho certo para a continuidade de nosso fracasso econômico.

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